Qual era o objetivo e o plano do rei?
Atingir Calecut constituía o objetivo principal da viagem. D. Manuel I teria escolhido a cidade para termo da aventura a partir das presumíveis informações que o seu antecessor (D. João II)[↑] recebera de Pêro da Covilhã[↑]; este, que ali estivera no final da década anterior, não podia ter deixado de verificar que a cidade era um entreposto vital em todo o comércio do Oriente, disseminado por uma complexa rede que penetrava no golfo Pérsico e no mar Vermelho, outra que se dirigia para o golfo de Cambaia, e ainda outras duas para Bengala e para Malaca - sendo esta decerto a mais importante do ponto de vista abastecedor de mercadorias.
O plano do rei de Portugal era interferir nesta complicada teia de relações e tomar a sua orientação. Naquele momento, porém, apenas cumpria a Vasco da Gama tomar contacto directo com a terra e com o rei de Calecut, e negociar com este um acordo comercial, instalando ali uma feitoria portuguesa, se tal fosse possível, a fim de iniciar o comércio das especiarias. A Armada tinha como outro objectivo, o encontro com os cristãos que se imaginava existir naquelas paragens.
Num sábado, dia 8 de julho de 1497, zarpou de Belém a armada de 3 naus [↑]: a São Gabriel [↑], a São Rafael e a Bérrio [↑], além de um navio para transporte de mantimentos, com uma tripulação que somava um total de cerca de 170 homens. Dois anos depois, a 10 de julho de 1499, regressavam a Lisboa apenas a São Gabriel e a Bérrio, com menos de um terço da tripulação que sobreviveu à viagem.
Comando e funções na Armada
Embarcações | Capitães | Pilotos | Escrivães |
São Gabriel 90 ou 120 tonéis |
Vasco da Gama - Capitão-mor da frota |
Pêro de Alenquer - experiente na rota do cabo da Boa Esperança , uma vez que acompanhara em 1487 - 1488 Bartolomeu Dias. Gonçalo Álvares - Piloto, mestre, mais tarde piloto-mor da Índia. |
Diogo Dias - irmão de Bartolomeu Dias, comandou uma das embarcações da expedição de Pedro Álvares Cabral. |
São Rafael 90 ou 100 tonéis |
Paulo da Gama - Irmão de Vasco da Gama |
João de Coimbra | João de Sá - comandou a São Gabriel entre Cabo Verde e Lisboa, no regresso, seguiu na viagem de Pedro Álvares Cabral. |
Bérrio 50 tonéis |
Nicolau Coelho | Pêro Escobar - participara na segunda viagem de Diogo Cão. tem o seu nome inscrito nas Inscrições de Ielala. Foi um dos pilotos da expedição de Pedro Álvares Cabral. | Álvaro de Braga - foi mais tarde escrivão de Diogo Dias na feitoria de Calecute. |
nau de mantimentos 110 ou 200 tonéis |
Gonçalo Nunes |
Afonso Gonçalves (provavelmente). |
Tripulação e Alojamento
Qualquer dos três navios tinha um mestre, marinheiros e grumetes em número sensivelmente igual (à volta de 10 unidades em cada categoria), dois ou três bombardeiros, despenseiro, carpinteiro, calafate, tanoeiro e criados. No navio -chefe iam por norma o presbítero, o mordomo do capitão-mor, o meirinho (oficial de justiça), os intérpretes e maior número de criados que nos outros navios – mais cinco ou seis pelo menos.
O alojamento do capitão seria na popa; a guarnição alojar-se-ia no convés. O porão iria completamente cheio (tonéis com água doce, mantimentos, sobressalentes, paióis da pólvora).
Chamou-se assim por ter sido vendida ao Rei D. Manuel I, para fazer parte da frota da Índia, pelo seu proprietário, D. Manuel de Bérrio, natural de Lagos, que a aparelhou por ser conceituado piloto na época. Era uma caravela latina - envergava velas triangulares que lhe permitiam bolinar melhor - robusta e veloz, com 30 metros de comprimento, três mastros e 50 toneis de porte (1 tonel igual a cerca de 1.000 litros), equivalente a cerca de 50 toneladas.
A nau São Gabriel desloca 120 tonéis; a São Rafael, um pouco menos, 100 tonéis; a São Miguel, destinada a transportar provisões e alimentos, era a maior de todas, pois deslocava nada menos que 200 tonéis. Somava-se às três uma caravela de 80 tonéis, a Bérrio.
Equipamentos de navegação
Peso da mastreação: 24 ton
Três andares de pano: 5 ton
Dois jogos de amarras e ferros: 13 ton
Massame: 6 ton
Sobressalentes: 18 ton
Armamento
Bombardas grossas e alguns berços: 6 ton
Projéteis: 6 ton
Pólvora e armamentos de mão: 6 ton
Provisões
Mantimentos para 18 meses: 97 ton
Líquidos para seis meses: 30 ton
Lenha para seis meses: 6 ton
Carga de comércio: 40 ton
Em 1487, Pêro da Covilhã e Afonso de Paiva foram encarregues de «descobrir e saber do Preste João e onde acham a canela e as outras especiarias que daquelas partes iam a Veneza por terras de mouros», rumando para Oriente, pelas vias normais de comércio. Em Adem, Pêro da Covilhã e Afonso de Paiva separaram-se, combinando encontrar-se, mais tarde, no Cairo. Pêro da Covilhã foi para a Índia, onde visitou algumas cidades, assim como outras da Arábia, e viajou em navios árabes até Sofala, na costa moçambicana. Entretanto, Afonso de Paiva rumava para a Etiópia. Nos finais de 1490, princípios de 1491, Pêro da Covilhã partiu para o Cairo para se encontrar com Afonso de Paiva, conforme o combinado. No Cairo, Pêro da Covilhã soube que o seu companheiro de missão morrera. Depois de remeter as informações obtidas sobre as navegações no Índico ao rei D. João II, através de dois emissários judeus, partiu para a Etiópia.
A maior parte dos historiadores concorda que foi o grande responsável pela planificação e organização do processo que levaria os portugueses ao Índico. Através dos seus diplomatas, a 7 de Junho de 1494, D. João II assinou o tratado de Tordesilhas e reafirmou as ambições sobre a África e a Ásia, obtendo ainda o domínio sobre 370 léguas a Oeste de Cabo Verde, área que permitiria à navegação portuguesa evoluir mais rápida e seguramente rumo a Oriente, em função da especificidade do sistema de ventos e correntes do Atlântico Sul e da convicção de que as terras que pareciam existir nessas paragens estariam sob alçada portuguesa.